Efeitos causados por mudanças climáticas vêm trazendo mais volatilidade à geração no setor elétrico, com impactos sobre vazões de rios que abastecem as hidrelétricas, produzindo cerca de metade da eletricidade no país.
Dados de Edvaldo Santana, ex-diretor da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) indicam que a situação tem piorado desde 2014. Para um período de 25 anos, entende-se que baseados nos dados do Operador Nacional do Sistema (ONS), que, entre 2000 e 2005, a energia natural afluente (quantidade de água que chega aos reservatórios das usinas hidrelétricas podendo ser transformada em eletricidade pelas turbinas de hidrelétricas) correspondia a 93% da média histórica das vazões registradas desde 1931, quando o indicador começou a ser analisado. Nos seis anos seguintes, a situação ficou mais confortável, com energia afluente de 98% da média histórica. A partir de 2014 ocorreu a mudança e a água para geração de energia é cada vez menor.
Entre 2014 e 2021, a energia afluente correspondeu a 76% da média, ou 22 pontos percentuais mais baixo que média registrada nos seis anos anteriores.
“É como se sumisse um montante suficiente para atender toda a demanda de energia do país por quatro meses. Nesse período, tivemos duas graves crises, em 2014 e 2021. E aqui vem um detalhe desolador: em 2022 e 2023, tidos como os anos de recuperação da crise de 2021, o volume de água que chegou às hidrelétricas foi bem menor que o de qualquer um registrado entre entre 2000 e 2013, excluído o ano de 2001, quando tivemos o racionamento. Ou seja, mesmo os anos mais úmidos do período recente são piores do que a média do passado mais distante” apontou Santana.
Melhor gerenciamento da água
Esses números significam que na última década os períodos úmidos estão abaixo da média histórica, indicando que a água nos reservatórios terá que ser ainda melhor gerenciada para o setor elétrico. Com isso, desafios como a coordenação do setor com outras esferas, sejam concessionárias de geração hidrelétrica, seja a Agência Nacional de Águas (ANA), vão ser enfrentados.
A demanda por água no Brasil vem se elevando a cada dia com aumento de cerca de 80% no total retirado nas últimas duas décadas. A previsão é de que um aumento de 24% ocorra na demanda até 2030, de acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
Outro desafio é a valorização da água acumulada nos reservatórios das hidrelétricas passando a ter um valor além da geração de energia elétrica, como por exemplo ao fornecer armazenamento ao sistema. Os reservatórios se tornam grandes baterias de água, atendendo a demanda instantânea no fim da tarde, quando o sol para de brilhar e a demanda é elevada.
“O modelo regulatório brasileiro foi estruturado com a predominância das hidrelétricas. Essas usinas representam cerca de 50% da capacidade instalada e, com a expansão muito acentuada das eólicas e solares, as hidrelétricas passam a ter um papel de confiabilidade fornecendo segurança ao sistema. Esses serviços precisam ser precificados porque vão além da geração de eletricidade” diz Marisete Pereira, presidente da Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica (Abrage).